domingo, 21 de fevereiro de 2010

Caminhando com saudades

Hélio Costa

Dia desses - um sábado ensolarado - saio de casa e vou dar umas voltas pelo centro comercial do Alto Maracanã. Muita gente fez o mesmo. O movimento é intenso.
Uma antiga loja da região está inaugurando suas novas instalações em um novo prédio: faixas, cartazes e muita gente...

Entro. Compradores e curiosos acotovelam-se nos corredores. Mocinhas delicadas distribuem graciosamente, doces e balas. O dono da loja, gentilmente, oferece também pequenas doses de um delicioso vinho - produto da região - servidas em copinhos de plástico descartáveis.

Em meio a papéis picados, cartazes coloridos e muita euforia, crianças, mulheres e jovens reviram as bancas enfileiradas, perdidos no colorido das estampas de peças bem modeladas... uma verdadeira festa!

Pouco mais abaixo, em uma esquina movimentada, caixas de som com volume estridente, chamam a atenção de quem passa, para o "Caminhão do Edredom" com ofertas fantásticas. Imperdível - anunciam.

Muitos veículos disputam as poucas vagas nos estacionamentos, agora reduzidas com a duplicação da Estrada da Ribeira.

Lentamente, caminho despreocupado pela rua cheia de gente. Observo com atenção cada pedaço de calçada, cada árvore, cada prédio...

Repentinamente sinto uma onda nostálgica bater com força em meu peito. Tenho a nítida sensação de que ela abre uma brecha e penetra com força em meu íntimo, indo agasalhar-se em um cantinho qualquer de minha alma, agora já um pouco melancólica. Um sentimento de amargura, tristeza e saudade, aos poucos vai me transportando para um passado não muito distante... nas asas do vento - com diria o poeta - viajo no túnel do tempo...

À semelhança de antigos filmes, há muito tempo assistidos, pedaços de cenas embotadas pelo tempo vão desfilando na memória: cabras pastando tranquilamente no terreno baldio, onde hoje se ergue o bonito prédio do Restaurante Popular; os saibros e as pedras soltas que dificultam a caminhada na íngreme subida da Rua Roberto Lamback Falavinha, em frente ao extinto Supermercado Roberto; árvores atrás do mercado, com ares de mata virgem, lançando uma sombra gigante no barranco desmoronado; o ronco dos motores da pequena serraria que funcionava atrás da, também extinta, Loja Santos, que cedeu lugar à importante Loja Milleniun, que constantemente surpreende com suas campanhas magistrais e ofertas arrasadoras; a "Farmácia do Geraldo", próximo ao Banco Bamerindus; a casa do carroceiro que vendia o leite tirado das vacas que mantinha em um amplo terreno atrás de sua residência, onde hoje está o prédio das Lojas CEM; depois... muito depois, veio o cartório, vieram outras casas, outros prédios, e tudo, rapidamente foi se transformando...

Uma rajada de vento seco chicoteia minha face. Como se despertando de um sono profundo, retorno ao presente. Estou em frente ao Colégio do Fátima. O semáforo me avisa que o sinal está verde e eu posso prosseguir na caminhada.

Aconteceu na cidade

Hélio Costa

Fim do dia... hora do retorno ao lar para desfrutar o merecido repouso e descanso, depois de um estafante dia de trabalho. É preciso recuperar as energias gastas na labuta das horas idas.

Antes de chegar em casa, uma passadinha no bar para comprar cigarros. Ainda é cedo. Mais ou menos 21h30minh. O tempo está chuvoso e a noite é silenciosa. Apenas dois ou três fregueses e o atendente que, solícito, lhe entrega a carteira de cigarros, para depois servir-lhe um cálice de vinho. Paga, e sai tranquilamente caminhando pela Rua São Pedro, no Jardim Nossa Senhora de Fátima, que está completamente deserta nessa hora; não pelo horário, mas pela chuva, talvez...

Ouve passos. Vira-se, e escuta: “È um assalto mano, passa tudo aí, rápido!” Automaticamente a mão desliza em direção aos poucos trocados que traz no bolso da calça... sente algo queimar-lhe as costas... perde completamente o controle das pernas e desaba no terreno molhado.

A dupla de assaltantes, ao ver alguém se aproximando, foge amedrontada, abandonando a "presa" sem nada levar.

Nelson não sente mais as pernas, a camisa parece estar grudada nas costas. O cheiro de sangue mistura-se ao da chuva, enquanto ele é socorrido e levado até o Pronto Socorro do Alto Maracanã.

“Por uma questão de milímetros você teria ficado paraplégico. Se a lâmina tivesse penetrado um pouquinho mais...” - diz o médico, após medicá-lo.
Depois de quase 10 meses praticamente imobilizado, Nelson, apoiado em uma bengala, ensaia os primeiros passos após deixar uma cadeira de rodas.

A festa acabou

Hélio Costa

E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
Carlos Drummond de Andrade

Pois é... A festa acabou. As luzes apagaram. O povo sumiu, porém a noite não esfriou. Mas a festa acabou... e agora?

Agora é voltar para a rotina do dia-a-dia.
Bem, vem aí o carnaval... mas aqui em Colombo não temos carnaval. Melhor dizendo: não temos folia; nem blocos; nem serpentinas. Os italianos nos brindaram com a cultura da uva e fabricação do vinho, mas não trouxeram para cá seus pierrôs, arlequins e colombinas... então, para nós, a festa realmente acabou.

Agora é acompanhar as crianças até o portão do colégio, deixar o pequeno na creche e ir pra luta: as filas nos bancos, os ônibus lotados, a prestação vencida, o carnê do IPTU, enfim... mas "vamos-que-vamos", afinal somos brasileiros, e "brasileiro não desiste nunca".
(Crônica escrita em 8 de fevereiro/2010 - no término da Festa da Uva em Colombo)

Desigualdade social um tema preocupante

Hélio Costa

A injusta distribuição de rendas em nosso país tem gerado uma situação caótica e preocupante. Apesar de ser um tema amplamente debatido e colocado em evidência pela mídia, quase nada tem sido feito de forma efetiva a respeito do assunto, e o problema parece não ter solução. A grande maioria dos políticos, infelizmente, passa a impressão de que apenas se aproveita do fato, para elaborar discursos arrebatadores apontando possíveis soluções que nunca passam de meras teorias.

Sabe-se que apenas uma pequena minoria da sociedade brasileira detém a maior parte da riqueza do país, enquanto a imensa maioria de nossa gente vive abaixo da linha de pobreza. O resultado disso é o que se vê nos grandes centros urbanos: crescimento exagerado e incontrolável das favelas; a marginalidade aumentando de forma assustadora; drogas; prostituição; crimes, e todo um cortejo de agentes destruidores que geram um clima de insegurança e desespero.

Está mais do que na hora do pessoal que governa este país entender que o clamor de uma população insegura, assustada, acuada, sem perspectiva de dias melhores e que não agüenta mais, dispensa discussões acadêmicas ou ideológicas e implora por mudanças profundas e urgentes.